Rei Joao I assinando a carta Magna em 1215
As eleições da semana passada na Inglaterra acabaram sem vencedores, o que não acontecia desde 1974. O partido mais votado foi o Conservador, liderado por David Cameron, com 306 cadeiras na Câmara dos Comuns – vinte a menos que o necessário para atingir a maioria. O Partido Trabalhista, comandado pelo atual primeiro-ministro, Gordon Brown, ficou com 258 cadeiras, em segundo. A surpresa da campanha, o Partido Liberal Democrata, dominado por Nick Clegg, obteve apenas 57 vagas. Como fazem há séculos, os ingleses vão lidar pacificamente – e com o humor azedo de sempre – com o impasse de uma eleição indefinida. A situação criada pelas urnas aguça a curiosidade sobre o funcionamento da democracia inglesa. Para entendê-la, é preciso desvestir a carga de conceitos inculcada pelo regime presidencialista:
• A democracia inglesa funciona (e bem) sem a separação de poderes. Todos os ministros têm de ser membros do Parlamento, formado pela Câmara dos Comuns (eleitos) e pela Câmara dos Lordes (indicados). O Gabinete, o Poder Executivo, é um comitê da Câmara dos Comuns. Até o ano passado, quando foi criada uma suprema corte, um comitê dos Lordes era o órgão máximo da Justiça.
• A monarquia não é ornamental. O monarca chefia o estado e (sempre) aprova a indicação do primeiro-ministro feita pelos Comuns. Desde o fim do século XIX ficou acertado que o monarca tem três direitos – "o direito de ser consultado, o direito de aconselhar e o direito de advertir".
• Não existem governadores. Toda a política é feita pelos Comuns.
• Quem ganha no distrito "carrega" todos os votos. Isso significa que os votos dados ao perdedor em cada distrito são inúteis. O modo distrital de votação não foi feito para garantir que o número de deputados de cada partido seja proporcional ao número de votos recebidos. O sistema se destina a produzir governos estáveis, com maioria nos Comuns.
Esquisito? Para as cabeças presidencialistas, sim. Mas natural para uma nação que há 795 anos impôs a um rei a Magna Carta, a primeira Constituição da história. Sim, cedo ou tarde, algum primeiro-minisro vai fazer reverência diante de Elizabeth II e ela vai aconselhá-lo a montar um gabinete de coalizão.
Fonte: Revista Veja.
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